sábado, 18 de março de 2017

Carol Santos: a realidade que o sonho fez




Em 2013 começava um novo ciclo de viagens anuais para a capital baiana que seria pautado pelo esporte.

Decidi ir sem pensar muito. Remava há menos de um ano, recém mudada de clube, sem parceira e inscrita numa prova de double e outra "solo". Foi bom me jogar de cabeça no mar das interrogações. Me permiti testar a capacidade criativa diante das adversidades e concluir que o mundo dá conta de abraçar e cuidar da gente.

Fiquei em um bairro tradicional, simples e mágico: a Ribeira. Em alguns momentos achava que estava de férias e era criança. Tomava cinco bolas de sorvete por dia cercada por novos amigos e a data para a grande brincadeira estava marcada. Participei do Campeonato Brasileiro Máster de Remo, dividi o barco com Marilene: mito entre as remadoras pelo talento e pela raça de continuar incentivando a prática esportiva por onde passa. Me equilibrei num skiff super leve sobre as águas do mar. No desequilíbrio e desafiando coisas novas encontrei meu chão. Esse foi o resumo daquela viagem que ainda me reservava uma supresa incrível que só foi constatada bem depois.

Nessa ocasião conheci a Carol. Remava há poucos meses. Menina da Ribeira, aluna da Marilene, sempre com um sorriso enorme no rosto e um entusiasmo contagiante diante da vida. Na Bahia, os jovens não são marrentos como no Rio. Eles conversam e se divertem com todos.

Viramos amigas e já naquela prova tosca do skiff peso leve eu tinha torcida de jovens gritando "vai Aninha!". Me senti em casa e desde então sempre volto pra pedir a benção à energia fantástica daquele lugar.

Mantive contato com a Carol. Enquanto estava na ativa no remo trocávamos tempos, falávamos de treinamentos e nos dávamos força para continuar nessa jornada. Um acidente me fez parar. Ela continuou com tudo. Largou faculdade e emprego na Bahia em troca da realização desse sonho. Enquanto estava lá, ensaiou projetos sociais para dar continuidade e não deixar morrer aquilo que deu vida e entusiasmo pra ela. O esporte transforma a gente. Depois, tudo que queremos é dar mais luz a esta luz pra ver essa transformação positiva na vida dos outros.

Carol estava fazendo aquilo que não soube fazer: a coisa certa, na hora certa e com todo brilho necessário nos olhos. Investiu tudo no terreno inseguro e crítico do esporte olímpico brasileiro. Fez bonito na Copa Norte-Nordeste, atraiu a atenção do então técnico da seleção, remou com as meninas que vestiam a camisa do país em competições internacionais, conviveu com a "rainha" Fabiana Beltrame ainda na ativa e voltou pra casa depois do training camp focada em seguir carreira no Rio.

Hoje está no Botafogo e briga por medalha na final A do Brasileiro. É uma das grandes promessas do remo feminino. É atleta exemplar. Voltou para a faculdade e é inspiração para qualquer pessoa que duvida da capacidade de realizar seu sonho. Tudo que ela construiu foi fruto do suor e dedicação dela. Até onde sei, não tinha ninguém pra pagar suas contas.

No fim do ano passado fui parar sem querer numa prova do estadual fluminense. Já vivia este momento complexo de ter encarado o êxtase olímpico e agora estar diante dessa crise sem precedentes no país. Passei na frente do Estádio de Remo e entrei bem na hora da prova da Carol. Ela descia a raia ao lado de fortes adversárias. Vinha em quarto e nos 250 metros finais passou todas e cruzou a linha de chegada em primeiro. Simplesmente inacreditável.

A jovem menina de Salvador me obrigou com sua postura e ato exemplares a levantar a cabeça e vislumbrar meu pódio.

Carol, que todo o axé positivo e suas forças se somem para fazer o barco andar hoje como nunca. Vai com a certeza de quem sabe que o seu lugar no mundo é o melhor. Vai com a pureza daqueles que só sabem jogar limpo e de coração. Vai e mostra pra todo mundo que mais vale acreditar num sonho e na sua capacidade do que ter dinheiro. Vai porque o esporte olímpico brasileiro precisa do seu impecável exemplo. Vai representando a altura o que a Bahia significa pro mundo. Vai que sua vontade de vencer e seus guias de luz te levam.

E obrigada por tamanha inspiração. Te conhecer me faz ser uma pessoa melhor.